gritas, gritam até que o outro ensurdeça, até que fique com os pés presos na lama e se esgote. gritas, gritam palavras e frases de uma ordem estéril que nos matará. rasgam os pulmões com cânticos, alucinados, com uma narrativa estúpida de quem nos crê estúpidos...e seremos? rangem os dentes, soltam os caninos e farejam a hesitação com o dedo no gatilho, lambem-nos o medo na pele... abrem as gargantas de onde saem línguas como canos apontados ao nosso cérebro, línguas sibilantes num hálito de enxofre, numa infindável oratória que nos queima a pele, nos rompe a mente. destroem o silêncio. gritam que somos vítimas, as suas vítimas, as legítimas, enquanto desviam o olhar e fecham as órbitas embaciadas para que a realidade não os capture. gritam, gritam e gritam pois enquanto gritam não param, não pensam, não deixam que ninguém pare, e ninguém pensa. embalam os corações nas bandeiras e nos hinos para conseguirem adormecer, para que o sono lhes sussurre que são anjos e que a trinche
Hoje de manhã, bem cedo, chego ao trabalho. Ligo o portátil. Arrumo a mochila. Ligo a máquina de café. De repente oiço um alarme. Um alarme com um som que nunca ouvi. Vou tirar café, mas o alarme não para. Será o portátil? Não! Será o meu telemóvel? Vou ver e é de facto o meu telemóvel. Leio no ecrã: "8h14. O tempo terminou!" Sento-me. Olho o rio pela janela. Espero que termine... São 8h30, a Antónia chegou e disse-me bom dia. Ainda cá estou! Falso alarme! Vou tirar café…