Avançar para o conteúdo principal

Fragmento.1/2

Dentro daquele momento peculiar quis não ser ele. Quis enterrar esse outro por entre a finura da areia. Adormecê-lo no grão das imagens que se revelavam na tibieza da tarde. Mas o fim deste dia estava contaminado e arranhava a sua pele com uma dureza de cores singulares.

Mexe-se e respira profundamente até quase extinguir todo o ar que ainda lhe pertence. Precisa romper com a linha que se desenha à sua frente. Dirimir a ameaça. Dá então alguns passos pelo paredão. Sente o corpo das pedras encostado à borracha gasta dos ténis. As arestas gastas das pedras da calçada, daquele paredão, que brilham indulgentes aos seus passos e magoam delicadamente os seus pés. Caminha vagarosamente, esperando que esta demora o devolva à sua espessa solidão. Esse estado notável e excêntrico que desde cedo teceu, alimentou e conservou.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Oiço o carpir do tempo no meu encalce

Oiço o carpir do tempo no meu encalce, enquanto corro a iluminar os últimos quartos.

A essência dos dias.3

Caminham agarradas pelas mãos. De mãos dadas. Enormes na sua tenra idade. Juntas na multidão que sai do comboio. Caminhamos juntos! Sobem a rampa a espalhar esse amor. O seu amor! Paixão! O amor que lhes pertence. O amor que agora vemos. Elas, e eles, e nós todos visíveis. Vemo-nos! Iguais. Iguais a mim! Iguais para todos?...Talvez ainda não...plenamente...mas estamos tão perto! Bendito dia! Bendita manhã inundada de esperança e luz! Bendito final de setembro.  O Sol e a alma vibrantes, neste instante feliz plantado no horizonte.

Uns cegos, outros surdos

gritas, gritam até que o outro ensurdeça,  até que fique com os pés presos na lama e se esgote. gritas, gritam palavras e frases de uma ordem estéril que nos matará. rasgam os pulmões com cânticos, alucinados,  com uma narrativa estúpida de quem nos crê estúpidos...e seremos? rangem os dentes,  soltam os caninos e farejam a hesitação com o dedo no gatilho, lambem-nos o medo na pele... abrem as gargantas de onde saem línguas como canos apontados ao nosso cérebro,  línguas sibilantes num hálito de enxofre, numa infindável oratória que nos queima a pele, nos rompe a mente. destroem o silêncio. gritam que somos vítimas,  as suas vítimas,  as legítimas,  enquanto desviam o olhar e fecham as órbitas embaciadas para que a realidade não os capture. gritam, gritam e gritam pois enquanto gritam não param,  não pensam, não deixam que ninguém pare, e ninguém pensa. embalam os corações nas bandeiras e nos hinos para conseguirem adormecer,  para que o sono lhes sussurre que são anjos e que a trinche